Segunda-feira, 8 de Outubro de 2012

O meu irmão gémeo é mais novo 30 dias

Parece estranho, mas para que percebam, vamos pensar naqueles dias frios e de chuva em que há a vontade de acordar só para almoçar, mas temos que levantar às oito da manhã, se não um gajo qualquer fica-nos com o emprego, com o carro, com a mulher e com os DVD’s. E ninguém quer perder Dvd’s, carro e emprego.

 

Comigo aconteceu o mesmo. Estava confortável, naquele útero fofo e quente e pensei “Então se calhar é melhor ir andado, para ver se me antecipo a este gajo muito bem-parecido e sexy, que por acaso é igual a mim.” Assim fiz. Mochila às costas e calçado confortável e mandei-me fora daquela vagina. A vagina é um sítio apertado e pequeno. Fica esta informação nova para os meninos com menos de doze anos e para todos os engenheiros informáticos. Há pessoal que tenta entrar de novo, mas, no máximo, só consegue até aos testículos.

Fui para a rua distribuir currículos e oferecer funções a empresários de bigodes e a senhoras de avental. Joguei na lotaria, arrumei carros e escrevi um livro humorístico chamado “O trabalho político de António Guterres”. Só uma pessoa o comprou e depois até me arrependi, porque podia ter arranjado de graça. Adiante…

 

Andava na rua, a lutar pela vida, qual sindicalista em causa própria, a pregar o individualismo e a servir-me de bandeja a toda a gente que tivesse patrão escrito no nome, enquanto o outro feto acomodado e malandro estava no quentinho e pronto para sair em dia agendado. Devo dizer ainda que aquele meu irmão gémeo tinha cara de garanhão e era muito parecido comigo.

Trinta dias de puro “bate à porta” e “olhe, desculpe. Era para saber se estão a precisar de alguém.” Ofereci-me a um gajo maneta para lhe coçar os tintins, para ele não se magoar com os ganchos, em troca de trezentos euros mensais mais subsídio de alimentação. Fui recusado! Mas aquele “mãozinhas de anzol” também não se vai ficar a rir.

Não consegui absolutamente nada. Nem na prostituição me dei bem, visto que fazia alergia ao cabedal e gastava mais dinheiro em pastilhas elásticas do que aquele que ganhava.

 

No dia marcado apareci para ver. A minha mãe estava em posição de canhão para soltar o malandro do meu irmão. George Clooney segurava-lhe na mão e dizia-lhe “Tu consegues, querida!” A minha família estava disposta por ordem alfabética numa bancada construída de propósito. Tinha comes e bebes para todos os gostos. Já agora aproveito para dar os parabéns ao catering por causa dos croquetes e do refrigerante de ananás. E à entrada da vagina tocava um quarteto de cordas da Orquestra de Viena, ladeados por um diplomata de estado pomposamente vestido e munido com uma tesoura para cortar uma fita. O puto por fim nasceu e era ver a população eufórica com o nascimento, até mesmo a que assistia pela televisão. Deram-lhe uma palmada e o puto, a meu ver só para se exibir, não chorou. Cantou Sinatra, só para chatear. Aplicaram-lhe uma plaquinha de metal na bochecha direita do rabo a dizer “João Carlos, remessa de 89. Futuro engenheiro com assento parlamentar.” E era vê-lo, ali, agarrado à mama e ainda nem sequer tinha mamado. E quando mamou, fê-lo com aquele olhar de “Ai e tal, tenho uma carteira de acções a render e mesa marca no Eleven para ir lá comer o Nestum.” E eu? Sem padrinho e sem uma cunha, meti-me no bagaço e nas compotas de fruta ainda sem ter idade. Chorava muito, mas ninguém ligava, porque pensavam que eram os dentes a crescer.

 

Johnny Almeida

Publicado por Universo de Paralelos às 19:48
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